E COMO MAI!

Este é o blog de Alex Correa e foi criado essencialmente como um centro de acesso aos trabalhos já publicados na lingua portuguesa, forma original.


Sunday, March 13, 2011

Rocha viva artificial: construção e uso VI

Texto e fotos por Alex Correa.

Sabemos até agora um pouco sobre as rochas vivas com relação à ecologia, materiais que podem ser utilizados, relevo, construção e curtimento. Veremos a partir dessa parte as melhores formas de como povoá-las com organismos.

Vários tipos de organismos chamados generalizadamente de zoanthids podem ser colocados sobre as rochas vivas artificiais. Na foto, temos alguns Protopalythoa sp., muitas vezes confundidos com Zoanthus spp. Esses organismos contém toxínas (palytoxin), produzidas por bactérias, e devem ser manuseados com muito cuidado.

Introduzindo os organismos:
Após passarmos pelo trabalho de curtidura do concreto logicamente precisamos adicionar vida às rochas para que se tornem úteis no que diz respeito a filtragem por bactérias, e esteticamente, com os organismos que almejamos manter nas mesmas. Podemos atingir esse objetivo através de dois princípios: coletando água marinha natural, ou importando organismos de outro aquário marinho já estabilizado, para que venham a se reproduzir e habitar as rochas fabricadas.

As bactérias nitrificantes e desnitrificantes são os organismos mais importantes, e felizmente os mais fáceis de serem introduzidos no sistema. Num aquário em que foi utilizada água salgada sintética, basta adicionarmos um pouco de água marinha ou de um sistema estabilizado. É necessário que haja amônia no sistema, para que o ciclo do nitrogênio seja iniciado, com a transformação feita pelas bactérias. O período de tempo para que haja estabilidade no ciclo do nitrogênio é de normalmente cerca de 30 dias. Alguns organismos mais resistentes podem ser adicionados juntamente com as bactérias. A quantidade desses organismos precisa ser bem pequena, acrescentando-se gradativamente durante os primeiros meses.

Quando a água coletada no mar não é filtrada ou tratada quimicamente, sabemos que não só organismos benéficos entram no sistema, como também existe a possibilidade de introdução de patogênicos e pestes. Uma observação importante a lembrar-nos: somente os organismos presentes na água, e que sobrevivem em aquários, poderão desenvolver-se a partir desse método. As explicações de como coletar água do mar corretamente, e maneiras de tratá-la para uso doméstico, fogem do foco desse artigo, mas basicamente falando, diz-se por coletá-la em lugares livres de poluentes diversos e onde o ambiente em geral apresenta aparência saudável. Presença de óleo na superfície da água, lixo na praia, água turva, desembocadura de rios ou riachos, superabundância de algas, ou evidência de material terrestre em áreas costeiras, de uma forma geral, definem água inapropriada para o aquário. Testes feitos com a água do mar retirada no local de coleta, nos mostram a compatibilidade do uso em sistema fechados. Os testes precisam ser feitos de preferência logo antes da coleta, pois as condições marinhas podem apresentar mudanças rápidas, uma vez que os fenômenos naturais atuam freqüentemente. Mudanças de marés e correntes marinhas são bons exemplos. Testes de pH, gravidade específica e fosfatos podem ser vistos como os mais recomendados. Isso tudo pode parecer evidente para muitos, mas por incrível que pareça ainda existe uma boa quantidade de pessoas que ignoram tais observações, o que acarreta em grandes problemas enfrentados por aquaristas. A grande maioria dos organismos planctônicos coletados acidentalmente com a água marinha não sobrevivem em sistemas caseiros, perecendo e deteriorando. Por isso devem ser evitados.

Da mesma forma que, quando colocamos rochas vivas secas num sistema marinho, ou mesmo qualquer tipo de material calcário seco no mesmo, assim também funciona com rochas contendo cimento em sua estrutura. O povoamento acontece de forma gradual. Primeiramente surgem as bactérias, algas-limo, algas filamentosas, até que comecem a surgir as algas coralinas e tudo se estabilize.

Com a fabricação de rochas vivas, temos a vantagem de reduzirmos a introdução de organismos indesejáveis no sistema. Mantis shrimp é um predador carnívoro e agressivo, muitas vezes introduzido no aquário através de rochas vivas naturais, apresentando perigo tanto para os habitantes do sistema, como também ao aquarista. Esse crustáceo normalmente entra no sistema sem ser percebido por seu diminuto tamanho, mas com o crescimento, podendo atingir até cerca de 30 cm de comprimento, surgem os problemas.

A forma mais eficiente de “semearmos” macro-vida nas rochas artificiais é colocando os organismos manualmente nas mesmas, com a presença de rochas vivas amadurecidas no sistema, que logicamente é de grande auxílio. A maior vantagem de mantermos um aquário de reef contendo somente rochas vivas artificiais é a possibilidade de selecionarmos cuidadosamente o que colocaremos no sistema, evitando assim a introdução de organismos indesejáveis, dentro do possível. Quarentenar os organismos coletados na natureza ou provindos de lojas, antes de introduzir no aquário principal, leva tempo e é trabalhoso, mas compensa pela segurança e certeza de um sistema sadio.

Circulação e iluminação amena durante o início da montagem precisam estar presentes para que haja o começo do amadurecimento do sistema. Trocas de água são muito importantes, e precisam ser feitas corretamente. Alguns ainda não conseguem entender porque seus aquários aparentam nunca chegar a um equilíbrio mesmo após muitos meses da montagem. Enquanto não existir uma certa rotina no sistema, o mesmo não consegue atingir equilíbrio. Quando o aquarista constantemente muda as propriedades físicas, químicas ou biológicas do ambiente no aquário marinho, dosa diferentes produtos e sem nenhum cuidado introduz organismos diversos não obedecendo uma ordem de compatibilidade e respeitando a capacidade filtrante do sistema, automaticamente está contribuindo para um desequilíbrio interminável em vários aspéctos, atrasando o amadurecimento e inconscientemente evitando a estabilidade tão almejada. Trocas parciais de água sintética requerem atenção para: a total dissolução e homogenização dos sais artificiais, leitura correta da gravidade específica, e velocidade da introdução da água nova no aquário, prevenindo choques ou estresses nos organismos, tanto para peixes como aos invertebrados.


Colocar as rochas no mar para serem povoadas nem sempre é possível. Ultimamente, com o surgimento de novas leis, em muitos países é exigido que tenhamos permissões para curtir e povoar as rochas no mar. Essas permissões são, na maioria das vezes, comerciais ou científicas, com restrição de área e quantidade. Normalmente consumidores, como aquaristas, não qualificam para tais permissões, portanto é necessário informar-se antes de tomar qualquer decisão. A consciência das possíveis intervenções que o nosso hobby possa influenciar na natureza ajuda-nos a entender e combater a coleta e o comércio inescrupuloso. O respeito às leis de coleta e pesca nos ajuda a sermos reconhecidos como aliados na preservação da natureza, mantendo um relacionamento sadio com os órgãos competentes, sem denegrir a imagem do hobby.

Algas coralinas incrustantes podem ser introduzidas no aquário marinho através de ”semeadura” com pedaços ou partículas das mesmas sobre as rochas. Powerheads são construídas de material plástico, atraindo o crescimento de algas coralinas sobre as mesmas. Raspagem da alga a ser “semeada” em outro sistema marinho não é difícil.

Algas coralinas incrustantes.
O que normalmente representa a alta qualidade de rochas vivas encontradas na natureza é, a princípio, a presença de algas coralinas incrustantes, logo também almejadas sobre as rochas artificialmente produzidas. Não há uma regra para seguirmos quanto ao que devemos colocar sobre as rochas e portanto isso fica de acordo com a vontade pessoal de cada um. O povoamento e cultivo de algas coralinas porém, parece ser uma meta comum entre a maioria dos aquaristas, por isso aqui trago alguns detalhes sobre elas.

Algumas medidas básicas para que haja um crescimento sadio de algas coralinas necessitam serem tomadas. O primeiro e mais importante é a introdução de tais algas no aquário e isso normalmente é feito colocando uma rocha viva amadurecida no sistema. Podemos também introduzir pedaços da algas coralinas, coletados em outro sistemas através de raspagem de qualquer superfície sólida, como rochas e powerheads, ou das paredes de um aquário já estabilizado. Aplica-se então esses farelos e partículas sobre as rochas artificiais, assim semeando o novo sistema.

Como todo processo de amadurecimento em aquários marinhos, sobre as rochas artificiais irão primeiramente surgir as algas indesejáveis e cianobactérias, naturalmente. Lutar contra isso é simplesmente tentar combater o processo natural de estabilização do sistema como um todo. Por outro lado, alimentar tais algas com: excesso de luz e alimentos aos peixes, ou negligenciar trocas parciais de água, além de evitar o uso de um desnatador de proteínas (protein skimmer), acarretam em problemas de explosão de algas. Um importante fator durante o aparecimento das primeiras algas (limo e filamentosas) é o controle dessas algas usando predadores naturais como caramujos, peixes herbívoros, assim como copépodes e anfípodes, componentes da micro-fauna.

Anfípodes são pequenos crustáceos que adaptam-se bem em sistemas fechados, apresentando papel importante na fauna e colaborando no controle de algas em aquários marinhos. A foto mostra anfípodes coletados dentre macro-algas marinhas.

Além disso, a distribuição de circulação de água no sistema precisa ser abundante e bem planejada. Circulação precoce em qualquer sistema marinho irá interferir negativamente na troca de gases pela superfície d´água, além de comprometer o desenvolvimento da estrutura das algas coralinas, que naturalmente necessitam de tal fator em seu ambiente.

Outras formas de estimularmos algas coralinas incrustantes em nossos sistemas é simplesmente livrando-as de ação predatória. Muitas vezes, mesmo tendo os resultados dos testes de forma satisfatória, ainda existem problemas com esse tipo de alga, apresentando áreas de coloração branca, cinza (área morta na estrutura superficial da alga) ou marcas de raspagem por organismos herbívoros. Carangueijos ermitões, assim como outros carangueijos, se alimentam não só de algas indesejáveis, mas também das coralinas. Um ermitão vendido muito nos EUA e que deveria ser evitado quando focalizamos o cultivo de algas coralíneas incrustantes é o Clibanarius digueti, ermitão de pernas azuis, originário do Golfo da California e das costas do México. Outros ermitões são também responsáveis por danos predatórios aos caramujos, corais e anêmonas. O aquarista tem maior vantagem acrescentando caramujos herbívoros para o controle de algas indesejáveis, como Trochus spp., Astrea spp.e os Turbo spp.

Algumas estrelas e ouriços-do-mar também se alimentam de algas, incluíndo as coralinas. Esses equinodermos possuem projeções especializadas localizadas em suas bocas para a raspagem das algas, como diminutos dentes. Além dos instrumentos de raspagem, ouriços produzem secreções que ajudam na raspagem das rochas. Esses organismos são normalmente encontrados em pequenos orifíceis nos recifes, onde se abrigam, protejendo suas partes mais sensíveis dos peixes predatórios.

Altos níveis de nitratos e fosfatos inibem o crescimento de coralinas incrustantes, portanto necessitando de um acompanhamento com testes, quando necessário. Um aquário completamente depleto de fosfatos porém será prejudicial às mesmas, portanto o uso constante de removedores de fosfato precisam ser evitados, quando usados em sistemas fechados. As taxas de nitratos e fosfatos podem ser controladas com trocas de água freqüentes, de acordo com a necessidade do sistema. Nitrato também pode ser eliminado parcial ou completamente em sistemas onde existe desnitrificação no substrato de fundo.

Uma vez que haja o aparecimento das algas coralinas sobre as rochas, é necessário alimentar as algas para que haja crescimento adequado e sadio, visando ainda sua reprodução.

Iluminação:
O planejamento da iluminação do sistema precisa ser feito de acordo com os organismos que serão mantidos nos mesmos. Para o propósito de enfatizarmos a criação de algas coralinas, podemos optar por diferentes tipos de iluminação. Existem várias espécies diferentes dessas algas, adaptadas em diferentes ambientes marinhos e logicamente com variadas qualidades de luz. Basicamente temos dois tipos de iluminação consernentes às coralinas incrustantes: luz forte e luz fraca, com amplo ângulo de possibilidade adaptativa entre as mesmas. As espécies de algas coralinas adaptadas à luz forte são normalmente encontradas na natureza localizadas bem perto da superfície da água, podendo até estarem até expostas ao ar por curtos períodos de tempo, durante a maré vazante. Sistemas caseiros, com iluminação artificial, é mais propenso à abrigar as espécies encontradas em águas relativamente mais profundas. Um fato interessante é que a maioria das espécies de coralinas incrustantes se adapta muito bem em aquários.
Iluminação pode ser feita com lâmpadas dos tipos: fluorescentes normais, HO, VHO, PCs ou até mesmo metal halides. A temperatura de cor pode variar de 6.500°K à 20.000°K. Uso complementar de lâmpadas actíneas auxiliam o crescimento da maioria das espécies. A adaptação das algas depende do tipo de luz e localização no aquário. Mudanças na iluminação podem afetar o crescimento de algas estabilizadas.

Trochus sp. e Turbo sp. são exemplos de caramujos eficientes no controle natural de algas em aquários marinhos e se reproduzem freqüentemente em sistemas bem estabilizados. Indivíduos com pouco tempo de vida são mostrados na foto.

Alguns aquaristas recomendam somente lâmpadas fluorescentes como a melhor alternativa para o crescimento e reprodução dessas algas. Isso se dá provavelmente porque as rochas vivas comercializadas no mercado aquarístico apresentam em sua maioria coralinas incrustantes encontradas sob as rochas, e sobre as mesmas, juntamente com as macro algas. Nesse caso, as coralinas presentes sobre a rocha recebem proteção de luz pelas macro algas, ainda na natureza. Quando as rochas são coletadas, as macro algas são retiradas. Uma vez que essas rochas vivas naturais são colocadas em aquários, após a “cura” e amadurecimento, desaparecem as macro algas por completo, predominando assim as desejáveis incrustantes. A maioria dessas incrustantes são espécies provenientes de ambientes com relativamente pouca iluminação, mas ainda conseguem se adaptar muito bem à iluminação feita por metal halides.

Com a parte 7 será finalizada essa série de artigos, completando as informações sobre povoamento das rochas vivas artificiais e manutenção para o melhor desenvolvimento do sistema marinho. <><

Referências:
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http://www.abcp.org.br/home.shtml
Cement and concrete basics:
http://www.cement.org/basics/concretebasics_curing.asp
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http://www.pacificaquafarms.com/AboutPAF.htm
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Making an aragocrate™ arch cave, with Eddie Postma.
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